Como surgiu a oportunidade de trabalhar com a equipe da Canibal Filmes?
R: Tudo começou
quando Gurcius Gewdner me convidou para estrelar “Frebby Dreck Ballet”.
Então, acho que o Petter Baiestorf me viu nesse curta e, como ele estava
montando o filme “O Doce Avanço da Faca”, se interessou pelo meu
trabalho, pediu informações ao Gurcius e entrou em contato comigo. Eu já
havia visto alguns filmes do Petter (entre eles os sexplotations
sanguinolentos “Vadias do Sexo Sangrento” e “Arrombada, Vou Mijar na
Porra do Seu Túmulo”) e receber o convite de trabalhar com a equipe da
Canibal Filmes foi para mim um grande presente.
Você já havia trabalhado sua
nudez antes do curta do alucinado Gurcius Gewdner, "Frebby Dreck Ballet"
(2010). E como foi a reação de seus amigos e familiares ao encenar a
personagem "Ana Clara/Fúria" no filme "O Doce Avanço da Faca" (2010), de
Petter Baiestorf?
R: Antes de
“Frebby Dreck Ballet” eu não tinha feito absolutamente nada que
envolvesse nudez. Aliás, eu era bastante envergonhada e tinha alguns
complexos referentes ao meu corpo. Durante toda minha adolescência eu
evitava usar blusas muito justas e quando ia à praia nunca usava
biquíni, vestia sempre uns maiôs ridículos ou então camiseta, nunca
trocava de roupa na frente de minhas amigas... Enfim, eu morria de
vergonha do meu corpo, achava meus seios muito grandes. Passei toda
adolescência me escondendo, não queria chamar a atenção, mas mesmo assim
lembro que no colégio os meninos me colocavam apelidos e mexiam
bastante comigo por causa dos peitões (risos). Eu odiava aquilo!
O tempo passou, e a menininha “patinho feio” cresceu e percebeu que não
era tão “patinho feio” assim. Comecei a me gostar, curtir meu corpo do
jeito que ele é, sem me comparar com outras mulheres, me aceitando do
jeito que sou. Mesmo me curtindo, nem passava pela minha cabeça fazer
topless por aí, muito menos em um filme! Lembro que eu assisti o filme
“Mamilos em Chamas” e me encantei com toda a trama, os personagens
marionetes, o casal de coelhos. Achei tudo aquilo genial e então
procurei descobrir mais sobre o diretor e assim foi como cheguei até
Gurcius Gewdner. Adicionei ele numa rede social e, para minha surpresa,
ele foi super receptivo e simpático. Até então eu não tinha a menor
intenção de participar de filmes, quer dizer, eu nunca tinha pensando
nisso. Mas como o Gurcius viu as fotos de algumas das peças em que
atuei, perguntou se eu era atriz e me convidou para filmar com ele. Ele
me explicou como seria e eu topei na hora.
Foi bastante formidável e tranqüilo fazer as cenas de “Frebby Dreck
Ballet”. Toda equipe me tratou com muito respeito, e acredito que essa
atitude foi essencial para meu bom desempenho no curta. Durante todo
tempo me senti muito a vontade e livre pra criar e o resultado foi
aquela maravilha da sétima arte. Adoro “Frebby Dreck Ballet” pela
sensação de liberdade que transmite. A nudez no filme, a meu ver, é
colocada não de forma sexual, e sim como algo natural, espontâneo e até
mesmo ingênuo e puro.
Trabalhar com o Gurcius Gewdner foi uma experiência fantástica. E eu
ainda estava deslumbrada com esses novos acontecimentos na minha vida,
quando surgiu o convite para trabalhar com Petter Baiestorf. Lendo o
roteiro de “O Doce Avanço da Faca” percebi que eu teria mais algumas
cenas de nudez, mas tirei isso de letra. Na verdade tenho muito mais
facilidade em fazer cenas de nudez do que cenas de violência. Não sei
explicar o porquê, mas desconfio que seja porque eu acho muito mais
bonito e fascinante um corpo nu do que um assassino, por exemplo. Mas a
maioria das pessoas se escandaliza ao ver uma cena de nudez e acha
confortável e banal cenas de violência. Não consigo compreender o porquê
disso. Para elas, o ato de encenar o amor ou estar ao natural é algo
condenável e repulsivo. Por sorte, minha família sempre me apoiou e se
orgulha de mim e do meu trabalho. Tenho uma família incrível e “meus
velhos” tiveram bom senso me dando uma ótima educação, com muito diálogo
e baseada na confiança. Sempre tive muita liberdade, tanto para
freqüentar lugares/sair, quanto para fazer os cursos e esportes que eu
me interessavam, me incentivavam bastante para a leitura e gostavam das
minhas amizades. Nunca ouvi algo, tanto de meu pai quanto de minha mãe,
sobre tabus ou comentários preconceituosos em relação a sexo. Enfim,
tive a sorte que pouco possuem!!!
Meus pais não chegaram a ver o filme “O doce Avanço da Faca”, mas viram
algumas fotos das cenas de nudez e acharam aquilo bastante normal.
Minha mãe elogiou bastante meu corpo e minha coragem. Mas mesmo se eu
não pudesse contar com o apoio da minha família, com certeza eu faria
tudo novamente, seguiria em frente porque a vida é uma só e não sou
dessas que fica se controlando por conta de preocupações com que os
outros vão pensar ou falar. Faço o que eu considero certo, vivo de
acordo com os meus princípios e consciência e não com o que uma
sociedade doente e hipócrita diz que eu devo ou não fazer.
Ah, quase ia esquecendo: meu namorado é a pessoa mais maravilhosa desse
mundo e me apóia em tudo o que faço. Quanto aos amigos, descobri que
tenho poucos verdadeiros e esses sim ficaram felizes em me ver realizada
no trabalho e se orgulham de mim me apoiando e dando muita força. Já os
falsos amigos... aaah, esses se corroeram de inveja com meu sucesso!
Foi só saberem que participei dos filmes para espalharem os maiores
absurdos a meu respeito. Mas de um lado isso foi bom para eu descobrir
quem realmente vale a pena, quem gosta de mim e quem se importa comigo.
Quanto à essas pessoas que eu acreditava serem meus amigos e que me
“apunhalaram” pelas costas não sinto mágoa alguma. Já os perdoei porque
sou uma pessoa maravilhosa com um bom coração (risos). Na verdade eu
sinto muita pena dessa gente frustrada e invejosa. Os perdoei do fundo
do coração, mas mantenho distância porque esse tipo de gente recalcada
eu quero bem longe da minha vida.
Qual a sua opinião sobre a exposição do corpo a partir da arte seja ela fotográfica, teatral ou cinematográfica?
R: Bom, como
comentei anteriormente, a nudez para mim é algo absolutamente normal,
natural e bonita. O corpo humano é tão lindo, uma das maravilhas da
natureza, deveria ser admirado, fotografado, filmado e adorado, mas
jamais censurado! Não consigo entender porque muitas pessoas enxergam
algo sujo ou imoral em um corpo nu. Nos dias de hoje, existe uma grande
inversão de valores, as pessoas criticam, discriminam e se chocam ao ver
uma cena/pintura/fotografia de nudez, mas consideram normal e não se
sentem nem um pouco desconfortáveis com a violência em reportagens
sensacionalistas dos telejornais, por exemplo. Falam mal de uma atriz
que mostra o corpo nas revistas ou em cenas de filmes como se isso fosse
uma falha de caráter, quando na verdade o “mau-caratismo” está
justamente em discriminar, julgar e prejudicar o próximo. Toda essa
censura e discriminação me incomoda bastante.
O mundo das artes está repleto de exemplos de censuras absurdas.
Recentemente fiquei indignada ao saber que a fotógrafa norte-americana
Nan Godin teve uma exposição cancelada no Brasil porque na última hora a
empresa patrocinadora considerou as fotografias “inadequadas”. Um outro
fato que me deixou bastante revoltada, aconteceu em 2009 - se não me
engano - com uma atriz de teatro chamada Malu Rodrigues (que tinha 16
anos de idade na época,), onde em uma peça fazia uma cena em que
mostrava os seios. “Mostrar as mamicas”: apenas isso bastou para nossa
sociedade hipócrita “cair em cima” dos pais da garota. O Conselho
Tutelar se meteu e parece que Malu precisou ser emancipada para ter o
direito de trabalhar e mostrar sua arte em paz. Absurdos como esse são
bastante comuns, seja no cinema, teatro, pintura e até em livros. Mesmo
em redes sociais somos constantemente censurados e denunciados. Eu mesma
perdi minha conta no Facebook por três vezes somente pelo fato de
postar fotos de nudez. E olha que nem eram fotos pornográficas,
explícitas. Eram obras de fotógrafos conceituados e também algumas das
fascinantes pinturas de Trevor Brown.
O mundo está cada vez mais doente e cheio de falsos moralistas,
hipócritas e controladores e infelizmente a arte em geral perde muito
por causa disso. É muito triste.
Como surgiu a idéia para a concepção do curta "A Paixão dos Mortos"?
R: Não lembro
exatamente como surgiu a idéia, mas sei que foi em uma das minhas muitas
conversas com o Coffin Souza. Filmamos o curta em uma tarde de sábado,
nos divertindo. Foi mais como uma brincadeira do que com a idéia de
querer fazer um filme perfeito, e o resultado me agradou bastante. O
curta, que já participou de alguns festivais e mostras, foi também
estrelado por Elio Copini e Cleiton Lunardi (nos papéis de zumbis),
fotografado por Petter Baiestorf, dirigido por Coffin Souza e editado
por Adriano Trindade e Toniolli. Fiquei feliz com essa produção em
parceria com o Coffin, que eu gosto e admiro tanto. Junto com ele também
participo do divertido “O Laboratório do Dr. Sepúlveda” que ainda está
em fase de produção. Acredito que nossa parceria não para por aqui, pois
temos muitas idéias e projetos que juntos colocaremos em prática sem
muita pressa.
Você só atua como atriz ou deixa sua marca pessoal em outros trabalhos?
R: Bem, no mundo
da arte já me aventurei na dança contemporânea e inclusive me apresentei
algumas vezes, mas tenho consciência que não levo o muito jeito para
dançar e por isso resolvi deixar o grupo e me dedicar mais à atuação.
Com certeza o curto período em que participei do grupo de dança ajudou
bastante o meu trabalho como atriz, pois toda dança, mas principalmente a
contemporânea, envolve muito a transmissão do sentimento e idéias...
enfim, dançar não deixa de ser atuar!
Outra coisa que me interessa bastante é a confecção de figurinos.
Trabalho como voluntária há 3 anos na Fundação Cultural na produção de
figurinos no final do ano, principalmente figurinos de ballet. E é um
trabalho muito gratificante, onde aprendo muito, não só sobre bordados e
costura. O estilista/bailarino/ator/artista plástico Carlos Alves,
responsável pela confecção dos figurinos é uma pessoa interessantíssima,
com um rico conhecimento cultural, e conviver/trabalhar ao lado dele só
me faz bem, aprendo bastante com ele e espero que essa amizade/parceria
continue por muito tempo.
Quais as musas inspiradoras de Gisele Ferran no teatro, cinema e literatura?
R: Quando se fala
em atriz teatro, o primeiro nome que me vem na cabeça é Dercy Gonçalvez.
Ela é uma das mulheres que mais respeito e admiro por tudo o que passou
e os preconceitos que teve de enfrentar, conquistando o público cheio
de moralismos da época em que começou no teatro de revista. Com jeito
desbocado e com muito bom humor, foi uma pessoa irreverente, forte e
batalhadora, uma mulher muito a frente de seu tempo. Assim também como
Simone de Beauvoir e Anaïs Nin, mulheres que sempre lutaram por
liberdade e independência e que admiro não só por suas obras, mas sim
por toda a história de vida que tiveram.
Gosto também da atriz pornô Sasha Grey (que agora está participando de
filmes não eróticos) pelo seu talento, beleza e inteligência. Admiro
muito também a brasileira Monica Mattos. Ah, são tantas as musas
inspiradoras no cinema: Tura Satana, Eva Green, Debbie Rochon, Maila
Nurmi...todas elas com estilo diferentes, mas com uma coisa em comum: a
personalidade forte.
No cinema underground, a minha ídola é, sem dúvidas, Dona Oldina do
Monte, a “Fernanda Montenegro do Trash Nacional”. Quem dera eu com 82
anos ainda estar participando de filmes com toda essa garra e vontade.
Um belo exemplo a ser seguido! Admiro também as musas do underground:
Ljana Carrion, Karina Bez Batti, Kika Oliveira, Mayra Alarcón, Mariana
Zani...
Mesmo sabendo que você faz
parte da equipe canibalesca de Petter Baiestorf eu tenho que fazer esta
pergunta. Gostaria de trabalhar com alguns dos outros diretores que
banham de sangue o nosso cinema udigrúdi? Quais?
R: Estou bastante
satisfeita em fazer parte da equipe Canibal Filmes, tenho certeza que
essa parceria vai durar bastante, temos muitos projetos para colocar em
prática, admiro pra caramba o Petter Baiestorf e o Coffin Souza e é um
prazer imenso fazer parte dessa equipe. Gostei bastante de trabalhar
com o Gurcius Gewdner também. Outro diretor com quem trabalhei
recentemente foi o André Bozzetto Jr., onde fiz uma pequena participação
na segunda temporada da websérie “Lua Perversa” e foi bastante
tranquilo e divertido trabalhar com ele. Ah são tantos os diretores que
admiro e com quem gostaria de trabalhar... José Mojica Marins, por
exemplo, Joel Caetano, Rodrigo Aragão, Newton Uzeda. Tem o também
catarinense Jone Shuster. Enfim, muita gente competente e talentosa!
Nos filmes em que atua você reforça a idéia de ser um "monstro sexual". A Gisele Ferran como pessoa também é assim?
R: (risos, muitos
risos!) Como falei nas respostas acima, comecei a fazer teatro pra
perder minha timidez. De certa forma o teatro me ajudou um pouco, mas
continuo sendo bastante envergonhada. Ao contrário do que se pensa, não
faço o tipo “mulher fatal”, não faz parte de minha personalidade. Não
sei me vestir de maneira provocante e não me sentiria bem com tais
roupas.
Um filme, um ator, uma atriz e uma frustração na sétima arte...
R: Ahhh, muito
difícil ter de escolher um filme e uma atriz apenas. Não saberia fazer
isso pois são tantos os que gosto. Mas escolherei o filme “Drácula”
(1931, com Bela Lugosi, um de meus atores preferidos). Por que este
filme? Pra fazer um paralelo com o filme que escolherei como uma grande
decepção do cinema: a saga “Crepúsculo”. Os adolescentezinhos fanáticos
pela saga que me desculpem, mas a idéia do filme é ridícula e a história
não tem nada a ver com os contos vampíricos, sendo um absurdo e uma
vergonha total. Onde já se viu um vampiro apaixonado que brilha sob o
sol?
Quais as novidades de Gisele Ferran para os fãs?
R: Nós da Canibal Filmes estamos com muitos projetos que pretendemos colocar em prática e espero que tudo dê certo para que isso aconteça em breve. Fiz pelo menos 3 filmes que ainda estão em fase de pós-produção. Logo menos estará disponível a websérie “Lua Perversa” no Youtube, em sua segunda temporada, onde os fãs poderão prestigiar minha pequena participação. Gurcius Gewdner lançará ainda esse ano ainda (assim esperamos!) dois filmes comigo no elenco que gravamos ainda em 2010, na mesma época de “Frebby Dreck Ballet”. Espero também terminar o filme “O Laboratório do Dr. Sepúlveda”, que fiz em parceria com Coffin Souza.
R: Nós da Canibal Filmes estamos com muitos projetos que pretendemos colocar em prática e espero que tudo dê certo para que isso aconteça em breve. Fiz pelo menos 3 filmes que ainda estão em fase de pós-produção. Logo menos estará disponível a websérie “Lua Perversa” no Youtube, em sua segunda temporada, onde os fãs poderão prestigiar minha pequena participação. Gurcius Gewdner lançará ainda esse ano ainda (assim esperamos!) dois filmes comigo no elenco que gravamos ainda em 2010, na mesma época de “Frebby Dreck Ballet”. Espero também terminar o filme “O Laboratório do Dr. Sepúlveda”, que fiz em parceria com Coffin Souza.
Muito obrigado por esta
deliciosa conversa e deixo aqui registrado todo o apoio do laboratório do Doutor K. Daver e da Ravens House Brasil para você e toda a equipe da Canibal
Filmes. Gostaria de deixar um recado para os fãs (e aos inimigos, se
também quiser, heheheheh...)?
R: Agradeço à você pelo apoio e oportunidade. Gostei muito da entrevista e é sempre um prazer poder divulgar e falar sobre o meu trabalho. Gostaria de agradecer também a todos os fãs e pessoas que curtem os meus filmes. Esse reconhecimento, admiração e carinho do público é a maior recompensa para mim. Isso é algo extremamente gratificante e que me deixa muito feliz. Para aqueles que quiserem acompanhar meu dia-a-dia e saber mais sobre minhas opiniões (muitas vezes polêmicas!), basta seguir meu perfil no Twitter: @Gi_de_Gisele. Tenho também um blog sobre Scream Queens, quadrinhos, fêmeas fatais, filmes sexploitation, horror, trash em parceria com o Coffin Souza chamado She Demons Zine.
R: Agradeço à você pelo apoio e oportunidade. Gostei muito da entrevista e é sempre um prazer poder divulgar e falar sobre o meu trabalho. Gostaria de agradecer também a todos os fãs e pessoas que curtem os meus filmes. Esse reconhecimento, admiração e carinho do público é a maior recompensa para mim. Isso é algo extremamente gratificante e que me deixa muito feliz. Para aqueles que quiserem acompanhar meu dia-a-dia e saber mais sobre minhas opiniões (muitas vezes polêmicas!), basta seguir meu perfil no Twitter: @Gi_de_Gisele. Tenho também um blog sobre Scream Queens, quadrinhos, fêmeas fatais, filmes sexploitation, horror, trash em parceria com o Coffin Souza chamado She Demons Zine.
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